segunda-feira, 15 de novembro de 2010

BRANQUEAMENTO PURO


Olhão, 15 de Novembro de 2010
À
Procuradoria-Geral da Republica
Rua da Escola Politécnica, 140
1269-269 Lisboa
Assunto: P. A. nº 69/2010
Vem o senhor Procurador-adjunto, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, como se tornou hábito, proferir despacho de arquivamento do processo administrativo nº 69/2010, com o qual não me conformo e por isso contesto da seguinte forma:
De facto o pedido foi instruído com copia da acta nº 14 referente a reunião ordinária da Câmara Municipal de Olhão realizada em 28 de Maio de 2008.
Diz o Ministério Publico que em face da denuncia e não obstante à partida não se vislumbrar a existência de fundamento porque fosse atendida a pretensão do denunciante….
Na deliberação em causa pode ler-se o parecer da Chefe de Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística:
Pretende o requerente autorização para o licenciamento do projecto de moradia de dois pisos com duzentos e trinta metros quadrados, localizada no Sitio do Laranjeiro, Moncarapacho e de acordo com a carta síntese do Plano Director Municipal em classe de espaço agrícola condicionado I. Como antecedentes, o processo foi viabilizado em termos de informação prévia, através do oficio numero treze mil quinhentos e quarenta e sete de vinte e sete de Novembro de dois mil e sete, que incorporou uma chamada de atenção para a entrada em vigor de novo instrumento de gestão territorial a condicionar as novas edificações nomeadamente em espaço rural. Assim, não tendo o projecto dado entrada no espaço de tempo à entrada à alteração do Plano Director Municipal verifica-se de acordo com o novo regulamento deste plano, ponto numero um do artigo vinte e quatro A, que é proibido a edificação dispersa em espaço rural, e nem a pretensão se integra nas excepções do numero dois do mesmo artigo.
Perante o exposto, considera-se de indeferir a pretensão nos termos da alínea a) do numero um do artigo vinte e quatro do decreto-lei numero quinhentos e cinquenta e cinco barra noventa e nove de dezasseis de Dezembro com a nova redacção dada pelo decreto-lei numero cento e
setenta e sete barra dois mil e um de quatro de Junho e notificar o requerente em termos de Código de Procedimento Administrativo.
Donde se conclui que a pretensão violava o PROT-Algarve e o PDM de Olhão e o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, posição reafirmada quando diz:
Os serviços técnicos nada mais têm a acrescentar, pelo que sugerem manter o indeferimento com base nos fundamentos invocados no oficio numero mil quatrocentos e trinta e sete de catorze de Março de dois mil e oito. Saliente-se que no oficio enviado pela Câmara em vinte e sete de Novembro de dois mil e sete, que notificou o requerente da viabilidade da informação prévia, foi o mesmo alertado para apresentar o projecto de licenciamento antes da entrada em vigor do PROT-Algarve, isto é dezoito de Dezembro de dois mil e sete. O referido projecto foi entregue em vinte de Fevereiro de dois mil e oito.
Não obstante este parecer claro, o órgão Câmara deliberou, por unanimidade, aprovar o licenciamento, à revelia do parecer técnico. Só o Presidente da Câmara e o Ministério Publico não vêem uma violação culposa dos planos de gestão territorial. Daí que o senhor Procurador-adjunto prossiga nos seguintes termos:
Como se vê a denuncia tem como assunto a dissolução de órgão, o que seria impossível, uma vez que o órgão já foi dissolvido por esgotamento do respectivo limite temporal e realização de novo acto eleitoral.
Aqui o senhor Procurador-adjunto, porque se tratava do cidadão, logo descortinou o erro, mas omite que no corpo do pedido se fala em perda de mandato.
Diz o senhor Procurador-adjunto:
Sucede que o referido artigo 9º da Lei 27/96, de 1 de Agosto, respeita à dissolução de órgãos…
Pois bem, a Lei nº 27/96, é composta por dezoito artigos e o único que pune a violação culposa dos planos de gestão territorial, é o 9º, alínea c) e obviamente, que a intenção será a punição daqueles que votaram favoravelmente a violação, de tal forma que apenas os eleitos que se pronunciaram contra podem participar na comissão administrativa a criar e resultante da dissolução do órgão.
...e a alínea c) só é aplicável à perda de mandato dos membros por remissão da norma da alínea d) do nº 1 do artigo 8º….
Com este entendimento do senhor Procurador-adjunto nenhum autarca perderia o respectivo mandato por mais violações que cometesse dos planos de gestão territorial.
Mas, e também porque, a Chefe de Divisão de Planeamento e Gestão Urbanística o refere, analisemos a situação à luz do Decreto-Lei 555/99 com as alterações introduzidas pela Lei 60/2007.
Comecemos pelo artigo 12º:
Nas áreas a abranger por novas regras urbanísticas constantes de plano municipal ou especial de ordenamento do território ou sua revisão os procedimentos de informação prévia, de licenciamento ou de autorização ficam suspensos a partir da data fixada para o inicio da discussão publica e até à data da entrada em vigor daquele instrumento…
Tal vem dar razão ao parecer emitido à Chefe de Gabinete de Planeamento e Gestão Urbanística.
Mais diz o artigo 24º do mesmo decreto:
O pedido de licenciamento é indeferido quando violar plano municipal de ordenamento, plano especial de ordenamento, …
E tem como consequência a nulidade, tal como previsto na alínea a) do artigo 68º, que diz:
São nulas as licenças, a admissão de comunicações prévias ou as autorizações de utilização no presente diploma que violem o disposto em plano municipal de ordenamento do território, plano especial de ordenamento…
Pelo que os actos praticados pela administração camarária são nulos. E se a nulidade não é um impedimento legal então o que será, sendo certo que se trata de um acto contrário ao Direito?
O artigo 69º diz:
Os factos geradores das nulidades previstas no artigo anterior e quaisquer outros factos de que possa resultar a nulidade dos actos administrativos no presente diploma devem ser participados por quem deles tenha conhecimento, ao Ministério Publico, para propositura da competente acção administrativa especial e respectivos meios processuais acessórios.
Assim, ou a Lei está mal feita ou o Ministério Publico que tenho contactado não é este dirigido pela Procuradoria-Geral da Republica.
Certo é que com esta acção e contra o Direito lograram vantagens patrimoniais para terceiros, actos que são susceptíveis de estarem abrangidos pela Lei da Responsabilidade Criminal de Titulares de Cargos Políticos, Lei 34/87, pelo que o Ministério Publico deveria ter extraído certidão com vista ao respectivo procedimento.
Junto alguns pareceres da PGR que pelo seu conteúdo, e com as necessárias adaptações decorrentes das alterações legislativas, podem esclarecer a situação presente.
P000a9a987:
1 - Nos termos do artigo 70, n 1, alinea a), do Decreto-Lei n 100/84, de 29 de Março, são causas de perda de mandato não apenas as inelegibilidades supervenientes, mas tambem as inelegibilidades ja existentes, mas não detectadas, previamente a eleição, desde que subsistentes;
2 - Consequentemente, perdem o mandato não so os membros eleitos dos orgãos autarquicos que, apos a eleição, sejam colocados em situação que os torne inelegiveis, mas tambem aqueles em relação aos quais ja se verificava, previamente a eleição, uma situação de inelegibilidade que, todavia, so veio a ser conhecida posteriormente, e ainda subsista;
3 - Nos termos do artigo 70, n 1, alinea e), do Decreto-Lei n 100/84 relevam sobre mandatos posteriores, determinando a sua perda, as ilegalidades e irregularidades praticadas em mandatos anteriores, mas so naqueles conhecidas (verificadas);
4 - Consequentemente, perdem o mandato os membros eleitos dos orgãos autarquicos que incorram na situação descrita na disposição referida na conclusão anterior, não so quando as ilegalidades e irregularidades são praticadas e conhecidas durante o mesmo mandato, mas tambem quando são praticadas durante um mandato e so no decurso do mandato(s) seguinte(s) vem a ser verificadas em inspecção, inquerito ou sindicancia e expressamente reconhecidas como tais pela entidade tutelar.
P 001071989:
1 - Salvo nos casos previstos nas alineas a) e b) do n 1 do artigo 9 da Lei n 87/89, de 9 de Setembro, compete ao Ministerio Publico propor as acções para declaração de perda de mandato por parte dos membros dos orgãos autarquicos - n 1 do artigo 11 da referida Lei - independentemente de solicitação do Governo;
2 - Perante uma demuncia de situação que possa determinar perda de mandato, em acção a propor nos termos do n 1 do referido artigo 11, deve o representante do Ministerio Publico competente: a) Remeter a denuncia ao Ministerio do Planeamento e da Administração do Territorio (artigo 6 da Lei n 87/89), nos casos e para os fins previstos nos ns 1, alinea c), 3 e 4 do artigo 9 da referida Lei; b) Proceder, se necessario, a recolha de infromações e esclarecimentos, visando a obtenção da fundamentação e prova necessaria, nos restantes casos (ns 1, alineas d) e e), e 2 do referido artigo 9).
P000821992:
1 - Durante o período que mediou entre a entrada em vigor do Decreto-Lei n 69/90, de 2 de Março, e a entrada em vigor dos Decretos-Leis ns 445/91, de 20 de Novembro, e 448/91, de 29 de Novembro, não existia norma específica que definisse a natureza do vício que afectava os actos administrativos de licenciamento de "obras particulares" ou de "operações de loteamento e de obras de urbanização" que violassem os planos municipais;
2 - Antes da entrada em vigor do Código do Procedimento Administrativo, (aprovado pelo Decreto-Lei n 442/91, de 15 de Novembro) este Conselho Consultivo, acompanhando a generalidade da doutrina, considerava nulo por "natureza", mesmo na falta de lei expressa, um acto administrativo que violasse o conteúdo essencial de um direito fundamental;
3 - Na aplicação da tese referida na conclusão anterior, o acto administrativo de licenciamento de obras violador de um plano municipal, mesmo na falta de lei expressa, seria considerado nulo - nulidade por natureza - se atingisse o núcleo essencial do direito ao ambiente (artigo 66 da Constituição da República), isto é, aquele mínimo sem o qual esse direito não pode subsistir;
4 - Decorrido o prazo para a impugnação de um acto de licenciamento de obras ferido de mera anulabilidade, não se pode aplicar o regime previsto no artigo 26 do Decreto-Lei n 69/90, por ter entretanto ocorrido a sanação do vício;
5 - O disposto no artigo 24 do Decreto-Lei n 69/90 aplica-se ao acto de licenciamento de obras violador do plano municipal plenamente eficaz, violação que é classificada de ilegalidade grave para efeitos de perda de mandato do membro de órgão e de dissolução de órgão autárquico;
6 - O regime previsto no artigo 24 do Decreto-Lei n 69/90 é aplicável mesmo que o acto referido na conclusão anterior seja considerado "anulável" e já tenha decorrido o respectivo prazo de impugnação;
7 - A sanação do acto "anulável" pelo decurso do tempo, só constitui caso decidido em relação aos seus efeitos directos, no caso concreto, o licenciamento de obras, mantendo o acto violador do plano municipal todas as características que levam o legislador a considerá-lo de ilegalidade grave para os efeitos previstos no artigo 24 do Decreto-Lei n 69/90;
8 - Porque o n 3 do artigo 52 do Decreto-Lei n 445/91 se apresenta com um conteúdo mais favorável do que o do artigo 24 do Decreto-Lei n 69/90, para que o acto administrativo do licenciamento de obra particular violador do plano municipal seja considerado "ilegalidade grave" deve, independentemente do tempo em que tiver sido proferido, preencher ainda os requisitos previstos naquela norma, isto é, afectar a qualidade do meio urbano e da paisagem ou implicar a degradação do património natural ou construído.
Posta a questão, sugiro se mantenha tal como no pedido inicial.
Com os meus respeitosos cumprimentos, sou
António Manuel Ferro Terramoto

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